sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A Docta Ignorantia

A possibilidade de o homem poder sempre se aperfeiçoar, de sempre evoluir em seu conhecimento e sua consciência, talvez seja o principal atributo que o torna superior a todo o restante da criação. Enquanto os outros seres crescem até determinado ponto, o ser humano ainda não conhece os limites de sua potencialidade.

Porém, apesar de potencialmente todas as pessoas terem essa infinitude de crescimento, apenas algumas poucas experimentam implementos realmente superiores. A maioria dos homens permanecem limitados à mimese, à repetição, à trivialidade. 

E não se mantêm presos a uma vida medíocre por que querem. Pelo contrário, crêem, sinceramente, que estão aptos ao infinito. No entanto, por desconhecerem o que é esse infinito, nem mesmo sabendo os caminhos que podem conduzir através dele, acreditam que suas escolhas, seus métodos, seus pensamentos e atos estão sempre corretos, sempre perfeitos para os fazerem atingir as mais altas esferas.

Na realidade, porém, o que se vê são vidas estacionárias, não obstante, satisfeitas. Isso porque sua mediocridade, para eles, são seus dons. É fato: quem não entende a infinitude da possibilidade e não percebe que ela existe para ser trilhada, acredita, realmente, que seu estado atual é o mais próximo possível das alturas.

Mas não se deve deixar enganar, pois "se alguém julga saber alguma coisa, com efeito, não aprendeu ainda como convém saber". Este é um princípio absoluto. Apenas a consciência do estado atual de distância em relação ao conhecimento amplo pode ser o principio da caminhada rumo a esse conhecimento.

Por isso Sócrates foi tido como o homem mais sábio. Não porque ele nada soubesse (como dizem alguns), mas, principalmente, porque ele sabia a distância que o separava da verdade límpida e transcendente.

Quando Nicolau de Cusa apela à docta ignorantia como método para o conhecimento, talvez ele tenha exagerado um pouco. Por ver o Absoluto como inacessível, tinha o conhecimento último como um não-saber. Ainda assim, creio que ao menos o princípio de seu método seja salutar. O fundamento dele é: a distância entre o eu e o Absoluto é imensa e os dados que tenho atualmente são pífios.

Diferente do cusano, que acreditava em um caminho no qual, por meio dos instrumentos meramente humanos, o homem ascendia até o limite da impossibilidade do conhecimento, eu entendo que essa ascensão segue até a manifestação imediata da realidade superior. Não defrontando o homem com o não-saber, mas, pelo contrário, ampliando incrivelmente o seu saber.

No entanto, essa ascensão apenas é possível com a ajuda direta da realidade superior, por meio da revelação ampla. Por nós mesmos, ainda por efeito da Queda, encontramos apenas a obscuridade, a confusão e a complexidade. 

De qualquer forma, para os que compreendem isso, o fim é a simplicidade da realidade plena. Para alcançá-lo, porém, precisamos ser guiados, conduzidos. Para isso, portanto, é imprescindível o primeiro passo, que é a consciência da ignorância. E esta pode ser resumida assim: quando sei que o que conheço é pouco, quando entendo que há uma realidade mais pura do que a complexidade obscura da minha visão presente e quando acredito que essa realidade não me é impedida, estarei pronto para o início da caminhada.

E quem me guiará, se meus dados iniciais são tão confusos? Ora, sem dúvida deverá haver uma ajuda externa e transcendente. E ela apenas pode ser dada pelo Espírito, pois "as coisas de Deus, ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus".

(no próximo post, farei uma reflexão sobre o encontrar-se perdido para achar-se)