sexta-feira, 3 de julho de 2009

Amigo de Deus

A diferença entre um verdadeiro cristão e um mero religioso é que aquele não apenas crê em um Deus pessoal, mas se relaciona com Ele intimamente. Isso parece tão óbvio, porém tenho percebido o quanto estamos nos afastando desse tipo de relação em favor de um contato pagão com Deus. Explico: uma carecterística comum de todas as religiões pagãs era possuirem deuses que pouco se relacionavam individualmente com os pobres seres mortais humanos. O contato destes com a divindade era ritualístico, praticamente impessoal. Os rituais religiosos eram a forma de se aproximar desses deuses, porém sem qualquer menção à relação direta entre o homem individual e o deus venerado. O cristianismo, no entanto, revelou uma face de Deus antes não bem compreendida: o amor que se envolve diretamente com o ser amado inferior. O que era absurdo para os gregos, os quais apenas concebiam o amor ascendente (o amado superior), foi revelado por Jesus Cristo sem qualquer ressalva. A partir disso, com a compreensão da simbologia do véu rasgado, o homem pôde saber que o Deus ao qual ele se remete não é uma entidade distante, alcançado somente por meio de mistérios iniciáticos, mas é o amigo acessível, a despeito de sua eterna superioridade, que nos ama e nos ouve.
O nosso afastamento não tem ocorrido por omissão (apesar de muitos cristãos negligenciarem a oração como forma de contato com Deus), mas, principalmente, pela maneira como nos dirigimos a Ele. As orações que tenho escutado em nossos templos têm se mostrado tão impessoais que parece que Deus está bem distante. São reivindicações, invocações, reclamações e instigações que se encaixariam muito bem numa linguagem entre empregados e seus patrões. Sabe aquele jeito impessoal de se dirigir a alguém como se o seu interlocutor não estivesse presente e você quisesse apenas mandar um recado por meio de outras pessoas? Sem contar o conteúdo que tem se restringido a requerimentos quase formais de satisfação dos desejos mais idiossincráticos.
Estamos perdendo uma amigo, não porque Ele tem se afastado de nós, mas porque estamos conservando-o a uma distância segura em relação às nossas vidas. O Deus próximo e pessoal é um incômodo que faz-nos deparar com nosso pecado, vícios e mentiras. O amigo sincero se torna o chato que só pela sua presença nos força a olharmos para dentro de nós mesmos e vermos a imensidâo de incoerências e impurezas que existe. Então, é muito mais agradável mantermos este amigo longe, a uma distância que Ele possa nos ouvir, mas não sussurrar aos nossos ouvidos.
O que não percebemos é que o que parece uma simples conveniência, na verdade é um desperdício absurdo. Se quem rasga dinheiro é louco, podemos ser chamados de loucos quando, tendo o Criador de todas as coisas e Deus Todo-Poderoso se dispondo a ser nosso amigo, nos ouvindo e estendendo suas mãos para estar ao nosso lado, preferimos a pobreza da vida pseudo-espiritualizada de quem apenas fala para Deus, mas jamais com Ele. E se esta noite Ele pedisse nossa alma?
Fica fácil compreender, com isso, quando Jesus diz que muitos agirão em seu nome mas não serão conhecidos por Ele. São aqueles que a despeito de repetirem a palavra Jesus Cristo incessantemente, não colocam a pessoa Jesus Cristo em suas vidas cotidianas. Estão sacrificando a um deus distante, adorando uma entidade, invocando uma divindade que parece menor.
Quando eu for recebido pessoalmente por Cristo, desejo que Ele me reconheça, não apenas como um bom religioso, mas como alguém que viveu ao seu lado. Quero perceber em seu olhar a confirmação de estar recebendo uma pessoa já íntima, da qual possui diversos segredos e confissões. Espero me deparar com aquele olhar de confirmação, próprio dos amigos que se conhecem há tempos e já não precisam das palavras para se expressar.
Para isso, não posso esperar mais. Preciso começar, desde já, a ter Deus em minha vida intimamente. Devo perder o medo de me confessar, de me expor. Devo, também, estar pronto para ouvir e obedecer. Devo ser amigo de Deus, numa amizade eterna que ninguém pode quebrar.