quinta-feira, 14 de maio de 2009

Nossos brinquedos

Vivemos em mundo fragmentado, no qual cada um sobrevive em seu pequeno espaço, sequer se preocupando em olhar para fora para ver o que está ocorrendo por aí. O individualismo chega ao seu ápice quando mesmo em relação aos assuntos mais universais as pessoas continuam enxergando-os como se fossem mera expressão pessoal de predileção e prazer.



Estava eu assistindo o programa do Jô Soares, no qual ele entrevistava os integrantes do grupo musical Paralamas do Sucesso, quando a conversa entrou no assunto do documentário que o baterista João Barone lançou sobre a Segunda Guerra Mundial, na qual seu pai havia lutado. O que me chamou atenção na fala do músico foi ele dizer que “sempre foi apaixonado pela Segunda Guerra Mundial”.

É claro que quando somos crianças, nós fantasiamos sobre as guerras, sobre os conflitos armados, como uma estória de bandidos e mocinhos que, no máximo, causam algumas mortes fictícias, nada mais. Quando nos tornarmos adultos, porém, tomamos consciência da realidade cruel das guerras e se nos interessamos pelo assunto, este interesse se dá menos por um fascínio infantil e mais pelo desejo de conhecimento histórico.

A afirmação do baterista não pode ser levada tão a sério, mas é um sintoma de como as pessoas enxergam a vida de um prisma absolutamente individual, tornando tudo apenas como uma representação mais ou menos fantasiosa de nossas predileções. Não importa o tamanho da realidade, nem o que ela representa para a coletividade, o que importa mesmo é como eu enxergo tal coisa, e isso é tudo.

Não acredito que João Barone ignore a realidade da Segunda Guerra Mundial, mas é evidente que seu interesse pelo assunto se dá apenas por um ângulo absolutamente pessoal. Isso não tem tanta relevância como caso isolado, mas é um pequeno exemplo de como, para as pessoas, a realidade deixou de ser uma verdade que se impõe para se tornar apenas um reflexo do que nós projetamos.

Ninguém pode ser apaixonado pela Segunda Guerra Mundial! Podemos ter fantasias infantis sobre ela, mas isso não cai bem a um homem adulto. Podemos até nos interessar pelo assunto e ter uma certa atração pelas estratégias de combate, pelo maquinário bélico e pela política envolvida, mas sempre observando essas coisas dentro de uma realidade maior que é a própria guerra e tudo o que ela ocasiona.

Este fato me faz refletir sobre como as pessoas têm buscado a fantasia como forma de representar a realidade. Sendo esta cruel demais, difícil de ser encarada em toda a sua extensão, é mais cômodo ver tudo como uma grande história em quadrinhos. Dessa forma, nada nos afeta, nada é tão importante e tudo não passa de mera brincadeira de criança.

As pessoas têm se contentado com seus respectivos mundo imaginários. Seus subjetivismos se tornaram a expressão da verdade e o que tem a ver com o outro, aquilo que diz respeito ao todo é absolutamente ignorado. Cada qual cuida de seus fetiches, de suas manias e de seus brinquedos. Cada um se diverte com seus prazeres pessoais. Nada tem mais tanta importância, desde que nos deixem em paz em nosso quarto de brincar.

Não estou exagerando sobre a fala de Barone, pois não é dela que estou me referindo, mas o que ela representa. É o exemplo do que vejo em todos os lugares. Não há mais realidade, mas realidades; não há mais verdade, mas verdades. Não há mais preocupações universais (a não ser que elas se refiram à minhas preferências).

Por isso, quando falamos de algo realmente importante, como salvação, eternidade, humanidade etc., as pessoas nos olham com olhar desconfiando, nos vendo ou como lunáticos ou então como pretensiosos megalomaníacos.