quarta-feira, 30 de maio de 2007

Fé pela Fé: passos sem direção

A fé é o caminho. Por ela é possível acreditar em algo sem descartar hipóteses divergentes, pois a busca do sábio é a verdade. A fé não é um refúgio para os ignóbeis, mas é a trilha em busca do destino real. Ter fé é querer a verdade e acreditar que ela existe no objeto da crença. Essa fé é adquirida por diversos meios, como conseqüência de experiências diversas. Mas ela não é um fim em si mesma. É a metade do caminho. O destino é a verdade, o real.


Para o escândalo dos religiosos: o conhecimento é maior que a fé, e está além desta. O conhecimento é o destino, o porto final. É para ele que caminhamos. Ele é a verdade, e apenas ele é capaz de libertar. O conhecimento tem a fé como o instrumento para atrair o homem, mas este alcançando-o, não necessita mais daquela. E esta verdade não se aplica apenas à fé religiosa, mas como sempre me diz uma amiga: os cientistas também possuem muita fé naquilo que eles fazem, e por isso defendem tão ardorosamente suas teses.

A Bíblia diz que fé é o fundamento firmado daquilo que se espera. Mas, e quando o que se espera chegar, o que fazer com a fé? Ela não se tornará desnecessária? O mesmo texto expressa que fé é a prova das coisas que não se vêem. E podendo ver estas coisas, ainda será necessário a fé? O que se espera e o que não se vê são o objetivo da fé. Porém, estes se materializando, aquela não tem mais utilidade, pois o objetivo foi alcançado.

Felizes são aqueles que não viram e creram. Eu creio, mesmo sem ter visto, por meio de uma apreensão diversificada, fazendo uso da percepção, da meditação e da experiência. Sei que isso agrada a Deus. Mas chegará o dia que verei face a face e não mais precisarei da fé para saber que Jesus vive. Meus olhos verão. Como não preciso de fé para crer que existo (a não ser que eu faça uma imersão filosófica e chegue a uma conclusão diferente), não precisarei de fé para crer que Deus existe, pois o meu ser presenciará isso, da mesma forma que presencia, hoje, a realidade que o cerca.

Mas este não é um tratado para desmistificar a fé. Pelo contrário, a intenção é colocá-la em seu lugar verdadeiro, entendendo qual a sua função na vida do ser humano. Canso de ver a exaltação da fé, como se ela fosse um fim em si mesma. Como se o objetivo fosse alcançá-la, e, a partir daí, as benesses de um magnânimo mundo espiritual estariam disponíveis para o fiel. Na religião moderna, o homem busca a fé, e não Cristo. Passa, então, não a viver pela fé, mas para a fé. Esta é o seu deus, o seu fim, o seu objetivo. Seria o mesmo que um corredor de fórmula um que não buscasse cruzar a linha de chegada, mas satisfeito por estar dentro de seu carro, andasse sem direção pelo autódromo. A fé, sem um objetivo a qual ela deve direcionar, transforma o homem num ser vagante, um andarilho, um nômade espiritual.

Sem fé é impossível agradar a Deus, diz a Palavra. Mas o cristão precisa saber que sua fé tem um objetivo muito claro: encontrar a Cristo. É por ela que o crente tem certeza que Jesus morreu numa cruz para salvá-lo. Por meio dela que ele sabe que este mesmo Jesus ressuscitou e vive e vai voltar para resgatar a sua igreja. Também por ela crê no poder de Deus e como este poder pode fazer grandes coisas ainda hoje.

O justo viverá da fé. Mas isso apenas acontece porque não temos a possibilidade de enxergarmos além dela. Como seres humanos, estamos limitados ao mundo físico, restritos ao universo presente, sem acesso ao futuro e ao mundo espiritual. Tudo o que esperamos, que sabemos existir além daqui, só é possível compreender por meio da fé. E este é o diferencial dos que amam a Deus: eles, mesmo sem ver, acreditam e confiam no amor do Pai, se sujeitam à sua vontade, se submetem ao seu senhorio. Não porque viram, mas porque crêem. Isso agrada a Deus e os permite ter acesso à vida eterna ao Seu lado.

O objetivo, porém, é Cristo. A fé é para ele. A fé é nele. Isso, para que ninguém se envaideça, crendo que é melhor por possuir uma virtude superior. A fé não é virtude, é instrumento. Pode-se ter fé nas coisas mais vis. A diferença é o objeto desta fé. Para o cristão, a fé o conduz a Deus, por meio de Jesus, e, por isso, ela se torna tão importante. Mas não basta ter fé, é necessário que o que se crê seja real. Não basta apenas a fé, é preciso que haja um objetivo, ao qual ela conduzirá. A fé pela fé é um instrumento de vaidade e egoísmo. Meu senhor é Deus, e não a minha crença nele. Quem opera em minha vida, faz milagres, abençoa e salva é Deus, e não a minha fé.